O MANIFESTO DO PARTIDO COMUNISTA
Em virtude das péssimas condições de trabalho na Europa, com o início da modernidade, surgiram vários movimentos operários, que formavam entidades com características dos sindicatos atuais.
Dentre esses movimentos, merece destaque a Liga dos Exilados, constituída de burgueses e operários de diversas partes da Europa. Posteriormente, os trabalhadores se desligaram e formaram a Liga dos Justos. Estes adotaram o seguinte slogan para definir as suas lutas: “Todos os homens são irmãos.”
A ramificação francesa do movimento proletário foi representado por Auguste Blanqui (o blanquismo), um movimento revolucionário; por Pierre-Joseph Proudhon, um sapateiro que reivindicava melhores condições de crédito para os artesãos; e por Louis Blanc, que exigia a participação do Estado na solução dos problemas sociais.
Entretanto, o principal elemento que contribuiu para o surgimento do Comunismo foi a influência do movimento cartista, assim denominado por se basear na Carta do Povo, proclamada em 1838, defendendo reformas eleitorais que permitissem maior acesso dos trabalhadores aos cargos políticos.
O socialismo, latente à época, era considerado um movimento burguês e assim surgiu o nome “Comunismo”.
Enquanto a Liga dos Exilados e a Liga dos Justos funcionavam secretamente, Marx defendia um movimento social de grandes proporções, como única forma de se modificar a situação social então existente. Karl Marx (1818-1883) e Fridrich Engels (1820-1895) eram alemães, mas viviam exilados, principalmente, em Londres.
O Manifesto do Partido Comunista foi encomendado pela Liga dos Justos, representada por três operários alemães, Bauer, Schapper e Moll, e publicado em fevereiro de 1848, em Londres, para substituir a cartilha Princípios de Comunismo, até então utilizada como paradigma do pensamento comunista.
Após essa publicação várias edições foram feitas em diversos países da europa, como Itália, França, Alemanha, Áustria, Hungria e outros do mundo inteiro.
É considerada uma das obras políticas mais importantes do mundo, comparável à Declaração de Independência Americana (1776) e à Declaração dos Direitos do Homem, na França (1789).
Tal relevância deve-se ao fato de que, como já comentado, O Manifesto não se constituiu em obra de protesto pontual, em busca de fins também específicos. É uma obra filosófica de amplo espectro, surgida do amadurecimento de vários movimentos operários da europa, movimentos estes conhecidos principalmente por Engels.
O marxismo pregava a auto-destruição do regime capitalista (burguês), e a conseqüente extinção da acumulação de riquezas, da propriedade privada e da segregação de classes sociais, surgindo uma sociedade dominada por trabalhadores. Contrapunha-se, portanto, aos movimentos radicais favoráveis à luta armada, como forma de dominação do poder estatal pelos trabalhadores, e ao movimento reformista, que admitia a manutenção da burguesia, mas buscava a conquista de mais direitos sociais pelos trabalhadores.
Na cartilha Princípios de Comunismo, Engels dava a seguinte definição de Comunismo:
“É um sistema segundo o qual a terra deve ser um bem comum dos homens. Cada um deve trabalhar e produzir de acordo com as suas capacidades, e gozar e consumir de acordo com as suas forças.
Para Marx e Engels, o Estado nasce dos antagonismos de classe. De acordo com O Manifesto, o Estado é “o comitê administrativo dos interesses comuns da burguesia.”
Por burguesia, entendia-se a classe dos capitalistas modernos, proprietários dos meios de produção social que empregam o trabalho assalariado.
O proletariado era, então, a classe dos assalariados modernos que, não tendo meios próprios de produção, são obrigados a vender a sua força de trabalho para sobreviver.
O quadro sinóptico seguinte mostra alguns trechos da obra em estudo:
Sociedades – visão histórica
Luta de classe (opressores e oprimidos). Patrício X Plebeu senhor feudal X servo mestre de corporação X companheiro burguês X operário
Revolução burguesa – implicações Despojou de sua auréola todas as atividades até então reputadas como dignas e encaradas com piedoso respeito. Fez do médico, do jurista, do sacerdote, do poeta, do sábio seus servidores assalariados.
Tudo o que era sólido e estável se desmancha no ar, tudo o que era sagrado é profanado e os homens são obrigados finalmente a encarar sem ilusões a sua posição social e as suas relações com os outros homens
Em vez de antigas necessidades e nações auto-suficientes, surgem novas demandas que exigem intercâmbio universal e uma universal interdependência. A burguesia aglomerou as populações, centralizou os meios de produção e concentrou a propriedade em poucas mãos. Burgueses e proletários – antagonismos O fantasma da superprodução ameaça o regime capitalista reivindicado pela burguesia. A cada crise, é necessário buscar-se novos mercados ou destruir-se parte dos meios de produção já criados. O desenvolvimento da burguesia leva ao desenvolvimento do proletariado, que só vive enquanto tem trabalho e só tem trabalho enquanto seu trabalho aumenta o capital. O crescente emprego de máquinas e a divisão do trabalho despojaram a atividade do operário de seu caráter autônomo, tirando-lhe todo o atrativo. O custo do operário reduz, quase que exclusivamente, aos meios de subsistência que lhe são necessários para viver e perpetuar sua espécie.
Depois de sofrer a exploração do fabricante e de receber seu salário em dinheiro, o operário torna-se presa de outros membros da burguesia: o senhorio, o varejista, o penhorista, etc. No começo empenham-se na luta operários isolados, mais tarde, operários de uma mesma fábrica, finalmente, operários de mesmo ramo, de uma mesma localidade, contra o burguês que o explora diretamente. O operários dirigem os seus ataques não só contra as relações burguesas de produção, mas também contra os instrumentos de produção; destroem as mercadorias estrangeiras que lhe fazem concorrência, quebram as máquinas, queimam as fábricas e esforçam-se para reconquistar a posição perdida do trabalhador da Idade Média (artesãos autônomos). Com o desenvolvimento da indústria, o proletariado não apenas se multiplica; comprime-se em massas cada vez maiores, sua força cresce e ele adquire consciência dela. De tempos em tempos os operários triunfam, mas é um triunfo efêmero. O resultado das suas lutas não é o êxito imediato, mas a união cada vez mais ampla dos trabalhadores. A burguesia vive em luta permanente; primeiro, contra a aristocracia; depois, contra as frações da própria burguesia, cujos interesses se encontram em conflito com os progressos da indústria; e sempre contra a burguesia dos países estrangeiros. Em todas estas lutas, vê-se forçada a apelar para o proletariado, a recorrer a sua ajuda e desta forma arrastá-lo para o movimento político.
Queda da burguesia - fundamentos O trabalhador torna-se um indigente e o pauperismo cresce ainda mais rapidamente do que a população e a riqueza. Fica assim evidente que a burguesia é incapaz de continuar desempenhando o papel da classe dominante e de impor à sociedade, como lei suprema, as condições de existência de sua classe. Não pode exercer o seu domínio porque não pode mais assegurar a existência de seu escravo, mesmo no quadro de sua escravidão, porque é obrigada a deixá-lo afundar numa situação em que é obrigada a nutrí-lo em lugar de ser nutrida por ele.
A condição essencial para a existência e supremacia da classe burguesa é a acumulação da riqueza nas mãos de particulares, a formação e o crescimento do capital; a condição de existência do capital é o trabalho assalariado. Este baseia-se exclusivamente na concorrência dos operários entre si. O Progresso da indústria, de que a burguesia é agente passivo e involuntário, substitui o isolamento dos operários, resultante da competição, por sua união revolucionária resultante da associação. Assim, o desenvolvimento da grande indústria retira dos pés da burguesia a própria base sobre a qual ela assentou o seu regime de produção e de apropriação dos produtos. Proletários e comunistas – medidas a serem implementadas 1. Expropriação da propriedade privada. 2. Imposto fortemente progressivo. 3. Abolição do direito de herança. 4. Confisco da propriedade de todos os emigrados e rebeldes. 5. Centralização do crédito nas mãos do Estado por meio de um banco nacional com capital do Estado e com monopólio exclusivo. 6. Centralização de todos os meios de comunicação e transporte nas mãos do Estado. 7. Multiplicação das fábricas nacionais e dos instrumentos de produção, arroteamento das terras incultas e melhoramento das terras cultivadas, segundo um plano geral. 8. Unificação do trabalho obrigatório para todos, organização de exércitos industriais, particularmente para a agricultura. 9. Unificação dos trabalhos agrícola e industrial; abolição gradual da distinção entre a cidade e o campo por meio de uma distribuição mais igualitária da população pelo país. 10. Educação pública e gratuita a todas as crianças; abolição do trabalho das crianças nas fábricas, tal como é praticado hoje. Combinação da educação com a produção material, etc.
Abstraindo-nos da questão relativa ao acerto ou não do pensamento comunista, o trabalho de Marx e Engels trouxe contribuições filosóficas relevantes, dentre as quais destacam-se (Leon Trotsky):
Concepção materialista da história – “até hoje a história de todas as sociedades que existiram até nossos dias tem sido a história das lutas de classes”.
Descrição do perfil capitalista – retribuição do trabalho na medida indispensável à produção; derrubada de valores sociais há muito cultivados, mediante a desumanização do trabalho; concentração da riqueza nas mãos de um número cada vez mais reduzido de possuidores em um dos pólos sociais, e o crescimento numérico do proletariado, cada vez mais pobre, em outro.
Visão comunista do Estado Moderno – “o governo moderno não é senão um comitê para gerir os negócios comuns de toda a classe burguesa”. “O proletariado não pode conquistar o poder por meio de leis promulgadas pela burguesia”.
Desnacionalização do proletariado – “os operários não têm pátria.”
A principal idéia que se tem, hoje, do Comunismo diz respeito às experiências malsucedidas na União Soviética e no Leste Europeu, embora tais experiências não tenham representado exatamente o pensamento de Marx. Com isso houve o enfraquecimento da crença na viabilidade prática de uma sociedade calcada na igualdade social e econômica dos seus membros.
Nas comemorações dos 90 anos de O Manifesto, Leon Trotsky analisou esse desvio da história visionária de Marx e Engels da seguinte maneira:
“O erro de Marx e Engels a respeito dos prazos históricos decorria, de um lado, da subestimação das possibilidades posteriores inerentes ao capitalismo e, de outro, da superestimação da maturidade revolucionária do proletariado”.
Leon Trotsky (1879-1940) revolucionário russo, colaborador de Lenin em 1917, foi o teórico da revolução permanente. Exilado por Stalin em 1929, fundou a IV Internacional em 1938 e morreu assassinado em Coyoacán, México, em agosto de 1940.
Após 150 anos de O Manifesto do Partido Comunista, observa-se que nem todas as previsões de Marx e Engels sobre a queda do capitalismo e da tomada do poder pelo proletariado se confirmaram.
A globalização da economia é fato, assim como a concentração de renda, a pauperização crescente do trabalhador e os conflitos comerciais surgidos a cada dia. Entretanto, o capitalismo tem conseguido, não só sobreviver, mas se fortalecer ainda mais.
Por outro lado, a desnacionalização do proletariado representa a possibilidade de que trabalhadores de outros países passem a concorrer no já deficitário mercado interno de trabalho de diversos países e se constitui mais numa ameaça à sobrevivência dos trabalhadores, um fantasma da globalização, do que numa viabilização da grande união internacional de trabalhadores, vislumbrada por Marx e Engels.
Finalmente, cabe fazer a seguinte indagação: A base teórica do Comunismo ruiu ou ainda não chegamos ao ponto de maturação, ao nível de sofrimento e desumanização da classe trabalhadora, necessária à decaída do capitalismo e à ascenção do proletariado ao poder.
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